Onze senadores do Partido Democrata enviaram, nesta quinta-feira (24), uma carta ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, criticando duramente a imposição de tarifas de 50% sobre as importações brasileiras. No documento encaminhado à Casa Branca, os parlamentares acusam o republicano de cometer “claro abuso de poder” ao usar a economia americana para beneficiar politicamente o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Críticas à interferência e riscos para os EUA
“Escrevemos para expressar sérias preocupações sobre o claro abuso de poder presente em sua recente ameaça de iniciar uma guerra comercial com o Brasil”, apontam os senadores. Segundo eles, interferir no sistema legal de uma nação soberana em favor de um aliado pessoal representa um precedente perigoso, que pode provocar retaliações comerciais e expor empresas e cidadãos americanos a prejuízos.
O grupo também argumenta que o Brasil é um parceiro comercial estratégico, com mais de US$ 40 bilhões em exportações anuais para os Estados Unidos — incluindo US$ 2 bilhões apenas em café. Além disso, o comércio bilateral é responsável por cerca de 130 mil empregos diretos nos EUA. Qualquer retaliação brasileira, afirmam os democratas, poderá aumentar custos e prejudicar famílias e empresas americanas.
Preocupação com aproximação Brasil-China
Outro ponto destacado na carta é o impacto geopolítico das tarifas. Os senadores alertam que uma guerra comercial entre EUA e Brasil pode fortalecer a aliança brasileira com a China. “Uma guerra comercial com o Brasil também aproximaria o país da República Popular da China (RPC) em um momento em que os EUA precisam combater agressivamente a influência chinesa na América Latina”, afirmam.
Eles concluem que o uso do peso da economia americana para influenciar o cenário político de outro país enfraquece a imagem internacional dos Estados Unidos e pode comprometer interesses estratégicos na região.
Resistência brasileira e defesa da soberania
Diante da tensão diplomática crescente, uma comitiva de senadores brasileiros embarcou nesta sexta-feira (25) para os Estados Unidos em busca de abrir um canal de diálogo e tentar evitar o agravamento do “tarifaço”. No entanto, segundo o jornalista Valdo Cruz, o ex-presidente Trump não teria autorizado qualquer conversa oficial da Casa Branca com representantes do governo brasileiro.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu às movimentações e reforçou o discurso de soberania nacional em um pronunciamento recente.
“Temos todo o nosso petróleo para proteger. Temos todo o nosso ouro para proteger. Temos todos os minerais ricos que vocês querem para proteger. E aqui ninguém põe a mão. Este país é do povo brasileiro”, afirmou.
As declarações também ocorrem em meio ao renovado interesse dos EUA nos minerais críticos e estratégicos brasileiros, como lítio, nióbio e terras raras — elementos centrais na corrida tecnológica e energética global. O encarregado de negócios da embaixada dos EUA no Brasil, Gabriel Escobar, voltou a manifestar esse interesse nesta semana, reacendendo a atenção sobre os recursos naturais brasileiros em meio à crise diplomática.
Leia a íntegra da carta abaixo:
“Prezado Presidente Trump,
Escrevemos para expressar sérias preocupações sobre o claro abuso de poder presente em sua recente ameaça de iniciar uma guerra comercial com o Brasil. Os Estados Unidos e o Brasil têm questões comerciais legítimas que devem ser discutidas e negociadas. No entanto, a ameaça de tarifas feita por sua administração claramente não se refere a isso. Tampouco se trata de um déficit comercial bilateral, já que os EUA tiveram um superávit de US$ 7,4 bilhões em bens com o Brasil em 2024 e não registram déficit comercial com o país desde 2007.
Na verdade — como o senhor afirma explicitamente em sua carta ao presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva — a ameaça de impor tarifas de 50% sobre todas as importações do Brasil e a ordem para que o Representante de Comércio dos EUA inicie uma investigação sob a Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 têm como principal objetivo forçar o sistema judiciário independente do Brasil a interromper a acusação contra o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro.
Interferir no sistema legal de uma nação soberana estabelece um precedente perigoso, provoca uma guerra comercial desnecessária e coloca cidadãos e empresas americanas em risco de retaliação. O Sr. Bolsonaro é um cidadão brasileiro sendo processado nos tribunais brasileiros por ações alegadamente cometidas sob jurisdição nacional. Ele é acusado de tentar minar os resultados de uma eleição democrática no Brasil e de planejar um golpe de Estado.
Usar todo o peso da economia americana para interferir nesses processos em favor de um amigo é um grave abuso de poder, enfraquece a influência dos EUA no Brasil e pode prejudicar nossos interesses mais amplos na região. O anúncio de sua administração em 18 de julho de 2025, de sanções de visto contra autoridades judiciais brasileiras envolvidas no caso do Sr. Bolsonaro, indica — mais uma vez — a disposição de sua administração em priorizar sua agenda pessoal em detrimento dos interesses do povo americano.
Suas ações aumentariam os custos para famílias e empresas americanas. Os americanos importam mais de US$ 40 bilhões por ano do Brasil, incluindo quase US$ 2 bilhões em café. O comércio entre EUA e Brasil sustenta cerca de 130 mil empregos nos Estados Unidos, que estão em risco diante da ameaça de tarifas elevadas. O Brasil também prometeu retaliar, e o senhor prometeu retaliar em resposta — o que significa que os exportadores americanos sofrerão e os impostos sobre importações para os americanos aumentarão além do nível de 50% que o senhor ameaçou.
Uma guerra comercial com o Brasil também aproximaria o país da República Popular da China (RPC) em um momento em que os EUA precisam combater agressivamente a influência chinesa na América Latina. Empresas estatais e ligadas ao Estado chinês estão investindo fortemente no Brasil, incluindo vários projetos portuários em andamento. Recentemente, o China State Railway Group assinou um Memorando de Entendimento para estudar um projeto ferroviário transcontinental.
Essas considerações não são exclusivas do Brasil. Em toda a América Latina, a RPC está trabalhando para ampliar sua influência por meio da Iniciativa do Cinturão e Rota. Estamos preocupados que suas ações para minar um sistema judicial independente apenas aumentem o ceticismo em relação à influência americana na região e deem mais credibilidade à agenda de autoridades e empresas estatais chinesas. A mesma tendência também está ocorrendo no Leste e Sudeste Asiático.
Os objetivos principais dos EUA na América Latina devem ser o fortalecimento de relações econômicas mutuamente benéficas, a promoção de eleições democráticas livres e justas e o combate à influência da RPC. Instamos o senhor a reconsiderar suas ações e a priorizar os interesses econômicos dos americanos, que desejam previsibilidade — não outra guerra comercial”.
Atenciosamente,
Tim Kaine, Senador dos Estados Unidos
Jeanne Shaheen, Senadora dos Estados Unidos
Adam B. Schiff, Senador dos Estados Unidos
Richard J. Durbin, Senador dos Estados Unidos
Peter Welch, Senador dos Estados Unidos
Kirsten Gillibrand, Senadora dos Estados Unidos
Mark R. Warner, Senador dos Estados Unidos
Catherine Cortez Masto, Senadora dos Estados Unidos
Michael F. Bennet, Senador dos Estados Unidos
Jacky Rosen, Senadora dos Estados Unidos
Raphael Warnock, Senador dos Estados Unidos
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