O cenário é familiar para qualquer um que acompanhou a política recente: um líder polarizador perde uma eleição, se recusa a aceitar o resultado e incita seus apoiadores a uma rebelião que culmina no ataque a prédios do governo. Enquanto nos Estados Unidos essa situação ainda se desenrola, no Brasil, a realidade é diferente. O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, conhecido como o “Trump dos trópicos”, se torna o epicentro de uma lição global sobre maturidade democrática.
Essa transformação, inclusive, rendeu ao Brasil o destaque na capa da revista “The Economist”, que o aponta como um farol de esperança na recuperação de nações assoladas pela febre populista.

O padrão brasileiro: Justiça acima da incompetência golpista
As evidências no caso contra Bolsonaro são reveladoras, incluindo a conspiração de um general e a ameaça de assassinos. No entanto, a tentativa de golpe falhou por ineficiência. Esse revés permitiu que a Justiça brasileira agisse, com a expectativa de que o ex-presidente e seus aliados sejam responsabilizados.
O contraste é notável em relação a outros países:
- Na Polônia, uma coalizão centrista enfrenta a oposição de um presidente do partido que perdeu as eleições.
- No Reino Unido, apesar da impopularidade do Brexit, seu idealizador, Nigel Farage, segue em ascensão.
- Em Israel, o cenário político permanece profundamente dividido, mesmo após eventos de grande impacto.
A comparação mais direta, no entanto, é com os Estados Unidos. Enquanto a democracia norte-americana parece oscilar entre a corrupção e o autoritarismo, com Donald Trump interferindo em instituições e ameaçando o uso da força, o Brasil se compromete a fortalecer suas próprias instituições democráticas.
A Força da Memória e a Unidade por Mudanças
Uma das razões para essa diferença é a memória recente da ditadura militar (1964-1985). A Constituição de 1988, a “Constituição Cidadã”, moldou um Supremo Tribunal Federal (STF) que se vê como o principal guardião contra o autoritarismo. Além disso, a maioria dos brasileiros compreende a gravidade das ações de Bolsonaro, abrindo caminho para uma rara união política em torno de reformas institucionais urgentes.
Há um consenso crescente, de empresários a políticos, de que é preciso avançar, deixando para trás a radicalização. Paradoxalmente, um dos alvos dessa reforma é o próprio STF. Com a Constituição de 65 mil palavras e uma carga de trabalho de 114 mil decisões em 2024, o tribunal acumulou um poder que, embora essencial para a democracia, também pode corroer a política. A reforma se mostra necessária, e até os próprios ministros reconhecem essa urgência.
Obstáculos e a Indesejada Interferência Externa
O caminho não será fácil. A primeira barreira vem dos Estados Unidos, com as sanções de Donald Trump ao juiz Alexandre de Moraes, responsável pelo caso Bolsonaro. Essa interferência, no entanto, pode ter um efeito contrário. O Brasil, com apenas 13% de suas exportações destinadas aos EUA, tem a flexibilidade de buscar novos mercados. Os ataques de Trump acabam fortalecendo a posição do atual presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva.
Os desafios internos são ainda maiores. Apesar do desejo das elites por mudanças, o país continua dividido, com apoiadores fanáticos de Bolsonaro que podem criar problemas. Reformar a Constituição e o STF exige que grupos abram mão de poder em prol do bem comum, o que naturalmente gera resistência.
No entanto, a diferença crucial está na disposição dos políticos brasileiros, de diversos partidos, em seguir as regras e buscar o progresso através de reformas. Essa é a verdadeira maturidade política, um papel de “adulto das Américas” que, temporariamente, parece ter se mudado para o sul.
Com informações: The economist
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